Chapman deu os tiros, mas os verdadeiros culpados estão soltos.
O lunático americano Mark Chapman não agiu sozinho na noite de 8 de
dezembro de 1980, quando acertou quatro tiros à queima-roupa em John
Lennon, em frente ao Edifício Dakota, em Nova York. Chapman puxou o
gatilho de seu revólver calibre 38 a mando da CIA, do FBI e de membros
da extrema-direita dos Estados Unidos. Diversas teorias sobre a morte do
ex-beatle surgiram 25 anos depois do ataque. Mas nenhuma é tão
eloqüente quanto a do advogado e jornalista britânico Fenton Bresler,
autor do livro Who Killed John Lennon? (Quem Matou John Lennon?, sem
versão em português). Bresler não tem dúvidas: o músico foi eliminado
por ser tido como um extremista e uma influência subversiva à juventude
americana.
Ele acredita que vários fatos confirmam a teoria
conspiratória. Primeiro, Lennon foi realmente investigado pelos órgãos
de inteligência dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha. Segundo, seu visto
de imigrante foi negado várias vezes pelo governo americano, que ainda
tentou deportá-lo. Terceiro, o assassinato aconteceu às vésperas de a
ala conservadora do Partido Republicano retomar o poder nos Estados
Unidos. Para piorar, uma nova informação apareceu em 2004: o serviço
secreto britânico, o MI5, desconfiava de ligações de Lennon com o
Exército Revolucionário Irlandês, o IRA.
A conspiração levou 11
anos para chegar ao último capítulo. Tudo teria começado em 1971, quando
Lennon realizou o concerto Free John Now Rally, pela libertação do
poeta e ativista político americano John Sinclair, preso por porte de
maconha. Até 1976, a vida do roqueiro foi vasculhada por espiões e
grampos telefônicos, virando um dossiê de 300 páginas. O FBI e a CIA
julgavam Lennon um radical perigosíssimo, pois tinha a capacidade
invejável de se comunicar com milhões de jovens, aqueles que aprenderam a
amá-lo como um dos Beatles. Qualquer idéia subversiva seria rapidamente
aceita pela juventude. O governo americano precisava detê-lo a qualquer
custo, pois estava em jogo a segurança do país. Segundo Bresler, a
solução encontrada foi a mesma já destinada a Martin Luther King e
outros líderes populares do país: o extermínio. Só que, em 1976, a
linha-dura dos republicanos perdeu as eleições presidenciais para os
democratas. Mais arejado, o novo presidente, Jimmy Carter, segurou o
ímpeto assassino da polícia federal e do serviço secreto. Assim, Lennon
conseguiu o green card e decidiu fazer um retiro profissional, sob a
alegação de acompanhar o crescimento de Sean, seu segundo filho, o
primeiro com Yoko Ono. Foram anos de paz, nos quais ele e a família
puderam viver em segurança nos Estados Unidos.
Como se sabe,
também foram os últimos anos de vida do músico. Em 1980, os republicanos
venceram as eleições e logo reassumiriam o poder. Nos últimos meses de
governo, Carter já não mandava em ninguém, muito menos no FBI e na CIA.
Ao mesmo tempo, Lennon estava lançando um novo disco, Double Fantasy,
que rapidamente estourou nas paradas de sucesso. Segundo Bresler, os
conspiradores decidiram iniciar o novo mandato presidencial sem o temido
extremista de esquerda. O agente de carreira William Casey, que
administrara a campanha vitoriosa de Ronald Reagan e nos anos seguintes
se tornaria um dos mais poderosos chefes da CIA, ganhou carta branca
para matar Lennon antes do final de 1980. Segundo a teoria de Bresler, o
assassino, Mark Chapman, já estava sendo preparado pelo programa de
controle mental do serviço secreto americano (leia mais na página 68).
Ele viajaria do Havaí para Nova York, procuraria a vítima e mataria
Lennon a sangue frio, à frente de testemunhas que, posteriormente,
pudessem identificá-lo como o criminoso. Essas testemunhas ? isso é fato
? foram a viúva Yoko Ono e o porteiro do edifício Dakota, Jose Perdomo.
Ninguém
contesta que Chapman atirou no ex-beatle. Mas as contradições, segundo
Bresler, provam que ele não arquitetou o assassinato. A Justiça condenou
Chapman sob a alegação de que ele buscava os seus 15 minutos de fama
nos Estados Unidos. Certo, matar uma celebridade colocaria qualquer um
nas capas dos principais jornais e revistas do país. No entanto, o
detetive Arthur O?Connor, a primeira pessoa a conversar reservadamente
com o assassino, disse que a acusação não fazia sentido, pois Chapman
sempre evitou a imprensa. Por que alguém em busca da fama se negaria a
dar entrevistas? Meses após o ataque, ele anunciou que matara Lennon
para promover a leitura do livro O Apanhador no Campo de Centeio, de J.
D. Salinger. O estranho é que, antes disso, nunca tinha falado com
amigos sobre a obra do escritor americano. Já preso, Chapman declarou à
BBC: ?Ele (Lennon) passou por mim e então ouvi na minha cabeça, ?faça,
faça, faça?. Não me lembro de mirar. Apenas puxei o gatilho com força,
cinco vezes?. Afinal, que vozes eram essas? Chapman não tinha passado de
maluco. Ao contrário, levava uma vida social normal e era considerado
um excelente monitor em acampamentos de garotos. A explicação: alguém só
poderia estar controlando a mente de Chapman.
Uma nova
revelação, divulgada em 2004, jogou luz sobre a tese de complô. David
Shayler, ex-agente do MI5, disse que os governos britânico e americano
trocaram informações sobre a suposta doação de 75 mil libras do músico
ao IRA. Sob suspeita de apoiar e patrocinar os terroristas irlandeses,
Lennon precisava ser eliminado. A viúva, Yoko Ono, negou a ligação do
marido com o IRA e lembrou que ele defendia os direitos civis.
Entretanto, os arquivos existem e estavam classificados pelo FBI como de
?segurança nacional?. Isso mostra que o autor de ?All You Need is Love?
era investigado de perto pelas inteligências americana e britânica no
início dos anos 70.
Demônios à solta
Para
um astro da grandeza de Lennon, apenas um complô seria pouco. A segunda
causa da morte envolve forças mais poderosas do que os governos da
Terra. As vozes que mandaram Chapman apertar o gatilho seriam do diabo, a
quem Lennon teria oferecido a própria alma em troca de fama e sucesso. A
dívida seria cobrada quando o beatle gozasse o momento mais feliz de
sua vida. Parece fantasia? Pode ser, mas a história a seguir é
verdadeira. A infância e a adolescência de Lennon foram marcadas por
tragédias e desilusões: ele cresceu sob a guarda da tia Mimi, sem a
presença do pai e da mãe. Aos 17 anos, estreitou laços com a mãe, mas
ela morreu atropelada logo depois. O primeiro casamento de Lennon, com
Cynthia, foi um fracasso. Os Beatles acabaram em 1969. Mesmo os
primeiros anos de relacionamento com Yoko foram conturbados. Os dois
brigaram e se separaram em 1973. Naquele 8 de dezembro de 1980, o
casamento e a carreira do músico fluíam bem. Lennon dizia que, pela
primeira vez em 40 anos, estava feliz. Mera coincidência? Não se você
acreditar na conspiração. Chapman escutou a frase demoníaca ?faça, faça,
faça?, sacou o revólver e disparou cinco tiros, quatro deles certeiros.
Pacto encerrado.
Como essa trama pode ser comprovada? Nas
músicas, capas de discos e declarações dos Beatles, afirmam os
defensores da teoria. No começo dos anos 60, Lennon revelou que o nome
The Beatles havia sido sugerido durante uma visão, por um homem que
aparecera numa torta flamejante. A criatura vinha do inferno e
chamava-se Pepper, não por acaso o sargento do aclamadíssimo trabalho
dos rapazes de Liverpool. Em 1966, declarou que os Beatles eram mais
famosos que Jesus Cristo. Junto com os parceiros de banda, adotou a maçã
como nome e símbolo da gravadora Apple (maçã) ? como se sabe, a fruta
que o diabo ofereceu a Adão e Eva. Lennon e Yoko foram morar no Edifício
Dakota, onde foi filmado O Bebê de Rosemary, de Roman Polanski, sobre
uma seita à espera do nascimento do demônio. Arrependido do contrato com
o diabo, Lennon deu sinais de desespero. Ele pediu socorro em canções
como ?The Ballad of John and Yoko? ? ?Acho que eles vão me crucificar?.
Como explicar que Lennon vivia infeliz apesar de todo o sucesso de sua
banda? Explica-se: ele sabia que, se demonstrasse alegria, chegaria a
hora de morrer. Até dez anos depois da dissolução do grupo de rock mais
cultuado do planeta, Lennon disfarçou bem. Até que o endiabrado credor
resolveu pôr Chapman à frente do Edifício Dakota. Difícil acreditar? Não
para quem ama uma conspiração.
Super